sábado, 12 de junho de 2010

Será que o PT vai querer pagar a conta?

Por Renata Camargo* do site Congresso em Foco.


Quando em junho de 2009, o PT deu sua cartada verde e apresentou um projeto de lei que propunha mudanças na legislação ambiental, poucos deram bola. Um ano depois, quando o deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) divulga o seu relatório com propostas de alteração no Código Florestal - baseadas algumas delas em sugestões petistas -, o barulho é grande. E a pergunta que paira no ar é: será que o PT vai querer arcar com essa conta ambiental?


O líder petista na Câmara, deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), diz que o partido ainda não definiu posição e que, dentro da legenda, tem os que são contra e os que são a favor. Um dos favoráveis é o deputado Anselmo de Jesus (PT-RO), que ajudou a construir o relatório e defende a proposta, apesar de discordar de alguns pontos. Entre os indecisos, está o deputado Dr. Rosinha (PT-PR), que afirma que ainda irá analisar o relatório, mas acredita que o partido poderá ter um posicionamento até a próxima segunda-feira (14).


O parecer de Aldo, apresentado ontem (9), está sendo acusado por ambientalistas de ser um escandaloso desmonte da legislação ambiental brasileira. Para produtores rurais, ele é visto como uma possibilidade de solução para impasses ambientais no campo, que têm preocupado agricultores e pecuaristas. Entre outras coisas, o relatório prevê o fim da reserva legal em pequenas propriedades, a suspensão de multas por crimes ambientais cometidos até julho de 2008 e a permissão para que grandes proprietários preservem bem menos.


O relatório de Aldo teve como base o projeto proposto pelos deputados petistas Leonardo Monteiro (MG), Geraldo Magela (DF), Nilson Mourão (AC) e Dr. Rosinha (PR). Ao contrário do que muitos ruralistas queriam, o parecer não foi construído baseado no projeto de Valdir Colatto (PMDB-SC) que revoga o atual Código Florestal e outras leis e cria o Código Ambiental Brasileiro. Ele adotou pontos dessa proposta, mas rejeitou outros. Daí a razão do descontentamento de parte da bancada ruralista.


Mas, apesar de basear-se no projeto petista, Aldo deixou de lado alguns princípios interessantes apresentados por aquela proposta. Ele manteve, por exemplo, o artigo que legaliza o plantio de culturas seculares em encosta, mas abandonou a previsão de uma contrapartida ambiental, segundo a qual deveriam ser firmados compromissos entre os produtos e o poder público para minimizar os danos ambientais causados.


Do projeto petista, Aldo adotou também um ponto pelo qual ambientalistas estão arrancando os cabelos. Ele copiou a possibilidade de se reduzir os limites mínimos de áreas preservadas ao longo de rios, nascentes, lagos e outros cursos d’água em até 50%. Mas o relator incrementou essa possibilidade de redução. Ele diminuiu os limites previstos na norma federal. O projeto do PT mantinha os atuais limites do Código Florestal. Aldo reduziu pela metade o limite mínimo.
Agora, às vésperas das eleições, o governo se coloca numa posição delicada. A candidata do PV à Presidência da República, senadora Marina Silva, já deu o tom da conversa e definiu o parecer de Aldo como “retrógrado” e regado a “interesses espúrios”. A candidata verde não citou nomes, não fez críticas diretas ao governo e evitou responsabilizar governistas (e candidatos governistas). Mas sinalizou que a conta é grande.


E que conta seria essa? O Greenpeace fala em números. A ONG calcula que, se a proposta de Aldo Rebelo for aprovada conforme está, o país perderá uma área de mais de 65 milhões de hectares de florestas só na Amazônia, num cenário conservador – o que quer dizer que esse número poderá ser ainda maior. Fala também que esse desmatamento poderá significar uma emissão de gases de efeito estufa 7,8 vezes maior do que prevê o compromisso do Brasil (governo Lula) com as Nações Unidas.


Em nota técnica e jurídica, a liderança do PV também fala dessa conta, mas de outra maneira. Afirma que o parecer de Aldo é “um grande retrocesso”, “retira diversas garantias ambientais” e “anistia produtores rurais multados”. Em artigo por artigo, a nota aponta que o projeto limita “drasticamente” a proteção ambiental. A permissão para suprimir a reserva legal em pequenas propriedades, por exemplo, é uma medida “absolutamente prejudicial ao meio ambiente”, na avaliação do PV.


A liderança verde assinala também que a proposta de Aldo permite que se continuem atividades agrícolas em áreas de preservação até que as propriedades sejam regularizadas conforme as novas regras. Para isso, é estabelecido o prazo de cinco anos, mas o PV critica que o relatório sequer prevê “medida para fazer cessar os danos ambientais causados por essas atividades”.


A legislação ambiental brasileira, considerada uma das mais rigorosas do mundo, nunca foi muito respeitada. A falta de cumprimento dessas leis se dá por vários motivos, que vão desde o desconhecimento das normas por parte da população até a falta de estrutura dos órgãos ambientais para executar as regras previstas. O impasse envolvendo a legislação ambiental e as atividades produtivas rurais se intensificou em 2008, quando o governo regulamentou a lei de crimes ambientais e multas e sanções passaram a ser aplicadas com mais rigor.


Os ruralistas afirmam que 90% dos produtores rurais estão na ilegalidade ambiental e que o Código Florestal tem sido motivo de pesadelo. O relatório de Aldo Rebelo vem como uma tentativa de sanar essa situação de irregularidade. Mas, assim como outras investidas, a tentativa é de mudar a regra no meio do jogo, e não de buscar novas estratégias para ganhar o jogo com as normas em vigor. E isso trará implicações políticas, positivas para uns e negativas para outros.


Ao que tudo indica, os ambientalistas vão querem achar o dono da conta ambiental. Se apoiar as mudanças no Código Florestal conforme propõe o relatório de Aldo, o PT poderá colar no peito da candidata do partido à Presidência da República, Dilma Rousseff, a medalha do desmatamento. Dilma já não é reconhecida por sua sensibilidade em relação às questões ecológicas. Então, não seria nada vantajoso pagar essa conta. Ao mesmo tempo, é preciso resolver o lado dos produtores rurais. Diante disso, o que resta agora é aguardar qual será a próxima cartada verde do Partido dos Trabalhadores.


Formada em Jornalismo pela Universidade de Brasília (UnB), Renata Camargo é especialista em Direito Ambiental e Desenvolvimento Sustentável pelo CDS/UnB. Já atuou como repórter nos jornais Correio Braziliense, CorreioWeb e Jornal do Brasil e como assessora de imprensa na Universidade de Brasília e Embaixada da Venezuela. Trabalha no Congresso em Foco desde 2008.

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